A MORTE DO DIREITO NA CPI DA COVID

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A cada semana transcorrida, um novo episódio de fanfarra jurídica chama a atenção na famigerada “CPI da covid”. O alvo da vez foi o empresário Luciano Hang, impedido pelo Relator da comissão de justificar suas respostas, em evidente cerceamento de defesa e de garantia de seu direito constitucional ao contraditório.

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Luciano Hang e o Direito à Ampla Defesa

Os senadores/inquisidores utilizaram como supedâneo o art. 213, do Código de Processo Penal, que preleciona que é defeso que “a testemunha manifeste suas apreciações pessoais”. Ora, pela própria redação do dispositivo, resta claro que o comando normativo é direcionado à testemunha e não ao acusado/investigado; afinal, está inserido no Capítulo VI, desse diploma legal, cujo título é “DAS TESTEMUNHAS”.

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Insta salientar que o sr. Luciano Hang estava sendo inquirido como investigado. Logo, é detentor de todas as garantias ínsitas a quem depõe nesta qualidade, na esteira do Capítulo V, do Código de Processo Penal, que rege o “INTERROGATÓRIO DO ACUSADO”. Logo, não pode o investigado ser tolhido de seu direto à defesa pessoal, elucidando cada fato de que é questionado com a explicação que lhe aprouver, sob pena de extirpar-se da legislação brasileira o direito fundamental à ampla defesa e ao contraditório, estampado no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal.    

Afronta ao Direito ao Silêncio

Este caso, lamentavelmente, não foi isolado no palco tragicômico da CPI. Em diversas oportunidades, contrariado pelos depoentes utilizarem-se de seu direito constitucional ao silêncio, o presidente Omar Aziz e seus asseclas valem-se de decisão do Ministro Luiz Fux que afere que, por nenhum direito fundamental ser absoluto, caberia à autoridade investida do poder judicial – o presidente da CPI – definir os limites do princípio da não autoincriminação.  

Direito ao Silêncio

A decisão é absurda por qualquer ângulo analisado. O raciocínio que se cria é que é constitucionalmente assegurado ao acusado ficar em silêncio a fim de não se incriminar, mas quem decide o que pode ou não incriminá-lo é o próprio investigador. Não há cabimento em tal proposição, tampouco procede o debate sobre o direito ao silêncio ser ou não absoluto. O art. 186, do CPP dispõe que: “Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas.” Repisa-se: de não responder perguntas que lhe forem formuladas. Vale dizer, o réu, ou investigado, pode recusar-se a responder a qualquer pergunta que lhe for formulada. Esse é o texto da lei, cuja semântica não deixa margem para interpretação.

A CPI da Covid e os Princípios do Estado Democrático de Direito

Relativizar esses direitos é transgredir os princípios fundantes do Estado Democrático de Direito e abrir via livre para o autoritarismo, permitindo, mesmo que por meios sutis, o regresso de bárbaras práticas inquisitórias. Basta o investigador afirmar que ao não responder ao seu questionamento, seja ele qual for, o acusado está abusando de seu direito. Como cabe a ele próprio decidir o que é abusar do direito, está resolvido o problema, simplesmente acaba-se com o direito ao silêncio. Da mesma forma, pode-se impedir qualquer resposta inconveniente sob a justificativa de que é mera opinião, conduzindo-se, neste prisma, o depoimento conforme o alvitre dos investigadores. Conjugando-se todas essas práticas, formado está o terreno perfeito para uma acusação sem fundamento válido, ao bom estilo totalitário almejado pelos hodiernos defensores da democracia.

Brunno R. de Lia Pires

Advogado Criminalista.

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